segunda-feira, 9 de maio de 2011

Um mau pensamento

Um jovem pastor estava entediado com a sua vida. Certo dia, estava deitado à sombra de um frondoso carvalho e, de repente, veio-lhe um mau pensamento. Sentia profunda antipatia por um dos carneiros do rebanho. Sempre o achava muito presunçoso e prepotente. Assim, pensou que podia amarrar ao rabo dele alguns ramalhetes bem secos e atear fogo. Queria ver o que aconteceria. Decidido, já estava juntando alguns galhos quando lhe apareceu uma figura vestida de branco e lhe disse em tom autoritário:
- Vem comigo e vê.
O pastorzinho obedeceu e foi ao cume do morro de onde podia ver o vale inteiro. Ele sabia que lá de cima dava para admirar o lago, o vale verdejante, as plantações e os vilarejos espalhados nas encostas. Uma beleza que alegrava o coração.
 – Olha bem – falou a figura branca.
O jovem olhou e ficou aterrorizado. O lago não existia mais, o vale estava árido e deserto e não tinha mais nem vilarejos e nem casas espalhadas.
 - O que aconteceu? – gritou – O que você fez?
– Não fui eu, não - respondeu a figura branca – foi você. Você torturou o carneiro, ele enlouqueceu, correu e bateu naquela árvore lá em baixo. A árvore caiu e desequilibrou aquela gigantesca pedra que rolou vale abaixo, bateu na barragem e a  rachou. A força da água fez o resto: invadiu o vale e destruiu tudo, vilas, casas e moradores. Não ficou mais nada da beleza de outrora .
Enquanto a figura falava, o jovem começou a chorar.
 – Tudo isso aconteceu por um mau pensamento...- continuava repetindo o pastorzinho consigo mesmo – Um pensamento mau que não consegui afastar!
Depois abriu os olhos e viu que tudo estava como antes: verde e bonito. Tinha sonhado, mas entendeu que todos os nossos pensamentos podem ter conseqüências para nós e para os outros.
Quando reflito sobre a página dos dois discípulos de Emaús, não posso deixar de pensar no desânimo deles, mas também na minha – e talvez nossa – experiência de desencanto. Provavelmente todos passamos por situações semelhantes. Nada mais do que fazemos , do que dizemos presta e tudo, afinal, parece inútil. As nossas esperanças e alegrias se vão. O nosso rosto fica triste e abatido. O que pode existir de bom e importante fica escondido atrás das desilusões, que têm mil razões para nos vencer. Pode ser uma situação de doença, uma decepção com pessoas, talvez algo conosco mesmo, ao admitirmos o nosso fracasso, porque fomos derrotados pelos nossos próprios defeitos. O que fazer? A situação parece sem saída. Maiores são as expectativas, maior o desastre da decepção. Maior o sonho destruído, maior o desânimo.
Fácil entender a situação dos dois discípulos de Emaús. “Nós esperávamos...” dizem ao desconhecido que os acompanha.  A esperança deles estava no profeta de Nazaré, mas este acabou morto numa cruz. É verdade que o túmulo dele está vazio, mas o resto é boato de mulheres. Aqui entra em cena a paciência de Jesus ao explicar-lhes as escrituras para ajudá-los a entender que era mesmo assim que devia acontecer. O peregrino desconhecido explica as coisas de um jeito tão diferente que os pensamentos de desânimo desaparecem. Em lugar deles surgem o entusiasmo e o ardor. Tudo fica claro quando reconhecem o estranho acompanhante ao repartir o pão, após ter-lhe pedido para ficar com eles mais um pouco. É Jesus! Que poder ele tem de mudar os pensamentos negativos em alegria, de despertar a compreensão e a fé em pessoas desanimadas e cheias de dúvidas? As suas palavras não podem ser uma simples explicação erudita ou pormenorizada, devem ter algo que acorda quem cochila e sacode quem dorme. Mais ainda, ele transforma os dois desanimados em testemunhas entusiasmadas: eles voltam, na mesma hora, por onde vieram, sem pensar duas vezes. Agora felizes.
Talvez o segredo esteja em caminhar juntos. Jesus, o misterioso peregrino, não convida para uma reunião ou uma palestra. Fala caminhando, fala como se ele também estivesse saindo de Jerusalém. Somente assim é acolhido como companheiro de caminhada. É um mestre humilde, partilha as dificuldades, mas não se dá por vencido. Retoma o discurso deles justamente do ponto onde tinha sido interrompido. É o diferente que se faz igual. É o novo que transforma o velho. Sem autoritarismos ou imposições, caminhando junto, questionando e buscando respostas. Hoje nos perguntamos se as velhas gerações conseguem dialogar com as novas, e se a juventude está disposta a deixar-se acompanhar, uns adequando seus passos aos dos outros.
Precisamos propor bons pensamentos, ter paciência para explicar, ter uma boa criatividade para imaginar um mundo novo, porque o mundo velho, fruto dos nossos maus pensamentos e das nossas más ações, já está bem visível aos nossos olhos.
Dom Pedro José Conti

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